O Mundo visto pelas Crianças
Junto com todas as manifestações da criação, o mundo visto pelas crianças é talvez a melhor maneira de recuperarmos a visão que temos dele.

Criança mostrando um desenho,
de Giovanni Francesco Caroto (1480-1556).
Museu do Velho-Castelo, Verona
(Imagem enviada por Patrick Corneau,
especialmente para esta seção)
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Quand l’enfant a suivi la grille qui fait le tour du bassin, il se croit enfermé. (J. Paulhan, Haïkaïs)
Quando a criança percorre a grade que está em torno da piscina, ela pensa que está enclausurada. (J. Paulhan, Haicais)
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À criança a realeza. (Heráclito, séc. V a. C.)
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Frase de um menino europeu: "No inverno, as árvores são de madeira".
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Camila, 8 anos, neta de Ayala Kalnicki Band, ao ver o Grand Canyon: "Vovó, it looks painted but it´s real".
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Frase lembrada por Jorge Coli (e selecionada por Adolfo Bloch) de um menino pequeno: "Cor-de-rosa é um vermelho muito devagar".
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Enviado por Paulo Portella Filho. O menininho espanhol visitava o interior da "Snake" de Richard Serra no Guggenheim de Bilbao quando disse ao colega de escola: "A mi me gusta el Pupy".
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Jorge Coli lembra-se ainda de outra situação ocorrida há 30 anos, quando estava na casa de amigos, na Jutlândia. Havia lá um casal com o filho de 8 anos. Brincando, Coli falou com ele em francês e em português. O garoto, que só falava dinamarquês, respondeu :"yes". A mãe, surpresa, perguntou por que respondera "sim". E ele : "Há muito poucas coisas para as quais a resposta é não!"
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"Qual a cor da água?" perguntou Luciana à Roberta. Sem piscar, a menina respondeu: "Da cor do espelho, ué!".
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Ainda uma da Luciana. O seu Léo, quando tinha três anos, ao ver um cartaz com o desenho da frutinha do guaraná pela primeira vez, exclamou: "Mãe, olha! A acerola abriu o olho!!!"
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Também da Luciana, a última do Léo, agora com 7 anos: "Mas Jesus, hein, mãe... sortudo... foi nascer logo no natal"!!!
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Essa é da Lúcia. Mas como ela não consegue ser sucinta porque é cronista (os cronistas natos não agüentam escrever só três linhas...) entra na seção assim mesmo, pois é ótima:
- Mãe, estou com uma hematoma no dedo.
- O que tem o teu dedo, Luciana?
- Uma hematoma. Foi o que a minha professora disse.
- Um hematoma, Luciana. “Um”. Não “uma”.
- Hematoma não é mulher?
- Não, hematoma é homem.
- Hum. Acho que ela falou “uma”, a professora.
- Ela errou. Hematoma é feminino.
- Assim, tipo “Dona Hematoma”?
- Quê?
- Nome legal esse para uma mulher. Dona Hematoma. Até rima, ona com oma. Ela deve ser uma mulher toda roxa. Um dia a gente escreve uma história sobre ela, vamos? Eu faço os desenhos da dona Hematoma, vou desenhar ela toda enfaixada, igual à uma múmia. Pode ser irmã da Dona Ferida. Mulher do Senhor Cicatriz...
- E o seu dedo, Lu?
- Meu dedo? Que dedo?***
De Carolina Vigna-Marú. Roberto, 3 anos: "O cotovelo é o joelho do braço" e logo em seguida: "O cachorro é um bicho de 4 cotovelos".
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De Alexandre, filho de Idelber Avelar, com 3 anos, chegando ao mar pela primeira vez: "Pai, pai, pai, vem cá me ajudar a olhar!"
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Da Bia Zonis: "Estava passeando com o meu filho Alex, no outono, ele devia ter uns 4 ou 5 anos, e falou: 'Mama, alguém pintou a árvore de amarelo!' E quando chegou o inverno ele disse: "Mama, a gente precisa comprar árvores novas, as folhas cairam todas...".
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A Lúcia lembrou da sua irmã, Ângela, que quando era pequenina e viu uma vaca pela primeira vez, ficou surpresa: "Olha, mãe! As vacas, ao invés de terem as mãos nos braços, têm mãos na barriga!"
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Da Bruna: duas garotinhas de seis anos conversam no quarto. "O que você vai pedir no NATAL ?" "Eu vou pedir uma Barbie, e você?" "Eu vou pedir um O.B." "O.B.?! O que é isso?!" "Nem imagino, mas na televisão dizem que com O.B. a gente pode ir à praia, andar de bicicleta, andar a cavalo, dançar, ir ao clube, correr, fazer um montão de coisas legais, sem que ninguém perceba..."
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O sobrinho da Márcia, de 5 anos, queria um caro baralho de desenhos japoneses e disse a mãe: "Mamãe, sabe porque esse baralho é tão caro?" "Não, Pipicho, respondeu ela". "Porque ele é importugado". Até hoje a família da Márcia se refere assim a produtos importados...
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Beatriz é filha da Neta, médica e escritora, autora de um livro sobre anestesia para leigos, Perdendo o medo de Anestesia - Mitos e Verdades (ainda à procura de um editor). Quando viu o mar pela primeira vez, Beatriz perguntou: "Mamãe ele nunca desliga?"
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Helô, a querida "bananinha" do blog world, lembra muito à propósito o saudoso médico carioca Pedro Bloch, com quem teve a sorte de se consultar uma vez na infância. Recorda-se que ele gostava tanto das frases infantis ouvidas no consultório, que publicava toda semana, na revista Manchete, a coluna "Criança diz cada uma... ". A Helô cita algumas delas que são antológicas:
"A boca é a garagem da língua"
"Relâmpago é um barulho rabiscando o céu"
"Helicóptero é um carro com ventilador em cima"
"Deus é a pessoa que dá os presentes pro Papai Noel"
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Conta a Fer que sempre se pega rindo quando lembra da sobrinha Paula: "Meu nome não é Paula, meu nome é Sereia"...
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A Joana, filha do Dudi, quando tinha uns quatro anos o olhou bem nos olhos e falou: "Sabe que estou me acostumando com você!?"
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Patrick é levado por sua avó para passear. Ela encontra uma amiga que também passeia com a netinha. As duas conversam e as crianças, nos respectivos carrinhos, olham-se sem dizer nada. A avó de Patrick percebe e lhe pergunta porque não cumprimenta a pequena. Ele responde: "Porque ela não me foi apresentada".
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Essa o Dudi não sabe onde ouviu: "Mãe tem um osso no meu pinto!"
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A Ana Lúcia tinha uma aluna que adorava fazer papel de mãe nas brincadeiras. Então, quando perguntava como ela se chamava, a pequena respondia: "Carmem Mãe Silveira". E Ana Lúcia conta também que, quando era criança, sempre pedia : "Mãe, eu quero suco de água..."
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Os filhos de Jane, Daniel e Lúcio, aos 7 e 4 anos, brincavam à mesa do almoço: "Vaca amarela cagou na panela; quem falar primeiro vai comer a bosta dela". Os adultos, sem prestar atenção, continuavam a conversa. O primeiro que falava recebia um "Ahh!! Comeu!!" Depois de uma boa bronca, Lúcio resolveu modificar a frase: "Vaca branca não fez nada na panela; quem falar primeiro não vai comer nada dela." Os adultos continuaram a conversar. Ao primeiro que falou, ele disse: "Viu? Não comeu!!"
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O Betão ficou tocado pelo inusitado da sobrinha que quando pequena lhe perguntou: "Porque temos de ser assim?" "Assim como?", disse ele. Colocando a mãozinha no seu rosto, ela foi apertando, apertando, apertando e, finalmente, respondeu: "De carne e osso". Diz o Betão (pura metafísica): "A criança quase sempre é um anjo descobrindo-se na matéria".
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A Lília envia um link pertinente para esta deliciosa crônica de Mário Prata.
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Dani, 4 anos, mais uma neta de Ayala Kalnicki Band, morava num kibutz quando ouviu de uma amiguinha:"Se você não se comportar direito, os árabes vão te matar". Resposta da pequena: "Então vamos vestir as nossas roupas mais bonitas e ir lá na aldeia deles brincar com as outras crianças. Assim, quando nos virem tão boazinhas, não vão nos matar".
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Mais duas de Idelber Avelar. Seu filhote Alexandre, aos 4 anos: "A chuva é o choro de Deus". E a filha Laura, aos 2 anos, ao vê-lo beijando a primeira namorada que teve depois de divorciar-se da mãe dela: "Pai não beija assim não que estraga o bigode!"
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Essa é minha e, se não tivesse sido contada por minha avó, não teria lembrado. Disse ela que passeava comigo no carrinho e que eu a olhava insistentemente. Ela deve ter se sentido embaraçada pois perguntou: "Sheila, o que é?". E então respondi: "Vovó, quando você vai morrer?"
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O Eduardo fez um post interativo com esta seção. Conta ele que a tia tinha acabado de comprar uma cadelinha para seus pais, ele e os 3 irmãos, ainda pequenos. Na euforia da chegada do novo “brinquedo” as crianças queriam, todas ao mesmo tempo, brincar com a pobre Kika que estava aterrorizada. Na tentativa salomônica de acalmar as crianças a tia sentenciou: "Se vocês não pararem, eu corto essa pobre cachorrinha em quatro pedaços iguais e distribuo um pedaço de Kika para cada um!" Todos ficaram em silêncio e, logo depois, uma das gêmeas perguntou: "Manhêêêê, posso ficar com a cabecinha?"
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A Cipy lembrou de três livros: Phrase book kids, de Roberto Duailibi (São Paulo, Mandarim, 1999) e Me dá o teu contente que eu te dou o meu, de Cristina Mattoso, (Verus,2003). No de Manoel de Barros, Exercícios de ser criança, ela pescou esta: No aeroporto o menino perguntou: "E se o avião tropicar num passarinho?" O pai ficou torto e não respondeu. O menino perguntou de novo: "E se o avião tropicar num passarinho triste?"
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Christine enviou esta. As suas gêmeas de 3 anos estavam vendo "Os 3 porquinhos e o lobo mau" em DVD. Louise, muito perturbada com o Lobo, ficou preocupada quando ele chegou na casa dos porquinhos. Clémence, assistia ao filme tranqüilamente. Ao ser perguntada porque não tinha medo, ela respondeu: "Eu não moro num DVD".
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O Zé enviou este cartum:

E também esta história de quando o sobrinho era criança. Eles estavam num campinho de futebol perto de casa e de repente uma nuvem nublou o céu. O garoto perguntou: "Quem apagou o sol, tio?"
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Frase da filhinha da Andréa, 5 anos, dita quando a levavam para a escola sob a chuva, em Recife: "ahhhhhhh mama, é por isso que no hino de Recife tem 'Recife, do Brasil Veneza, bela Natureza...' porque quando chove alaga tudo né?"
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Uma amiga da Argênide foi chamada para buscar o filho de 5 anos na escolinha pois ele se dizia enjoado. Ao chegar em casa o menino estava ótimo, correndo e brincando na maior alegria. A mãe perguntou: "Você não estava enjoado?" Ele respondeu: "Sim, estava enjoado. Da escola."
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Esta é da própria Argênide, quando tinha a mesma idade. Ela chegou muito preocupada para o seu pai: "Papai, eu também vou trabalhar quando crescer?" Ele: "Claro, vai sim." Ela: "Mas como? Se não sei fazer nada..."
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Esta história é da filhinha da Gracinda, com 2 anos, no mercado: "Mamãe, estou com dó deste homem". A mãe mudava de assunto e ela continuava: "Mamãe, estou com dó deste homem". A mãe disfarçava e ela: "Mamãe, estou com dó deste homem". Finalmente, o homem que tinha ouvido tudo, perguntou com um sorriso: "E aí, garotinha, porque você está com dó de mim? Ela respondeu, com a carinha marota: "É que você está tão velho, que vai morrer logo..."
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Extratos do blog L'Autofictif, do escritor Éric Chevillard, onde ele conta as coisas que falam as suas filhas Suzie e Agathe. Enviados pelo Patrick. Obrigada Patrick!
(Minha tradução do francês)
EU: "Vai, vamos embora!"
SUZIE: "Eu não me chamo 'vai'!"
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AGATHE (diante de suas ervilhas): "Isto não me dá vontade de ter fome."
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AGATHE : "Como é possível que a gente goste de água, se ela não tem gosto? Ou... é um gosto de nada?"
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SUZIE: "Quando eu era bebê, eu tinha que idade?"
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AGATHE: "Verdade que temos um monte de sangue dentro do corpo?"
EU: "Sim, Agathe."
AGATHE: "Então porque não dói?"
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EU (admirando o desenho de Agathe): "Magnifica a tua ave."
AGATHE (consternada): "Mas, afinal, você está vendo bem que é uma coruja!"
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SUZIE: "O vovô, ele morreu em que vida?"
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Eu (à Agathe que continua a tagarelar depois que pedi silêncio): "Psiu!"
AGATHE: "Quando você diz psiu, você fala, hein?"
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Todas as contribuições dos leitores para a seção O Mundo visto pelas Crianças serão muito bem-vindas!
Marcadores: amor, cores, crianças, humor, imaginação, lembranças, visões
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